Parte 16
REVELAÇÃO:
um perigo oculto
E.5.:
1781, 7/2 OUT.
Reino primordial (realidade
paralela)
Era a primeira vez que o mago
se ausentara do castelo desde que pegou os garotos como discípulos e ainda não
retornara. Ainda bem que não proibiu Daro de ver o amigo já que havia levado
Calus junto e havia proibido Daro de sair do castelo em sua ausência, o que
significava que ia ficar muito chato sem as aulas de caça. Fora ele só havia o
Darksh de criança em todo o castelo. Somente magos de armadura e capacetes
prateados, sempre cobrindo o rosto, para todos os lados era só o que se via.
Uma única tocha iluminava os
dois garotos sentados no chão separado apenas por uma grade de pedra
acinzentada com pigmentos verdes espalhados por todas as barras.
— Então, do que vamos brincar
hoje? – perguntou a criança de vestimenta preta enquanto saboreava o ensopado e
o pão que Daro trouxera. Daro permaneceu calado como se não tivesse escutado,
apenas navegando em seus pensamentos – Daro? Está tudo bem? – Questionou vendo
o amigo disperso.
— Tá sim, é que meu pai vai
me deixar fazer o teste de inquisição, só que eu ainda não consigo fazer a
minha magia despertar.
— Inquisição? O que é isso? É
alguma brincadeira? – Disparou as perguntas curiosas como de costume.
— Não é uma brincadeira, é um
teste pra ver se eu tenho aptidão pra mago... Ou não. – Finalizou abaixando a
cabeça desanimado.
— E como funciona? O que você
tem que fazer? – Bis ignorou o desanimo do amigo e prosseguiu com as perguntas
curiosas, agora com um sorriso no rosto.
— É assim... Tem um salão
enorme e redondo, dentro dele tem um enorme pilar cristal verde que vai do piso
até o teto, e ao redor tem outros pilares mais finos e mais baixos. Fica
fechado a maior parte do tempo, mas as vezes quando um dos serviçais abre pra
lavar eu vejo de relance. – Daro se empolgou ao comentar, e agora esboçava um
sorriso – Aí eu tenho que fazer a minha aura fluir pra fora, e depois os
pilares reagem ao tamanho do seu potencial. Calus conseguiu fazer todos
brilharem como nunca, é o que o meu pai diz. – Finalizou voltando a ficar
cabisbaixo de novo.
— E qual é o problema então?
– Questionou ainda sem dar muita importância ao jeito moribundo do amigo.
— É que eu não sei fazer nada
disso.
— Estranho, não deveria ser
um problema pra você. – Esboçou Bis enquanto enxugava o restinho do ensopado
com o pão.
— Como assim? – Perguntou sem
entender do que o amigo falava.
— Já aconteceu algumas vezes.
– disse. Largou o prato no chão – A primeira vez que nos vimos eu percebi de
imediato, primeiro eu pensei que fosse só minha imaginação, mas depois eu
passei a entender o padrão. – Continuou.
— Ainda não estou entendendo
o que você quer dizer! Que padrão? – Daro agora se aproximara da grade com a
curiosidade muito atiçada.
— Lembra-se da primeira vez
que veio aqui? – Daro fez que sim com a cabeça – Você estava tão concentrado em
não ser descoberto e em não fazer nenhum barulho que era praticamente como se
você nem existisse. Nem mesmo eu percebi a sua presença até você parar bem aí
onde está agora.
— Sim, mas e o que isso tem a
ver com a minha aura ou com magia. –Daro deu de ombros ainda sem entender nada.
— Calma! Você se lembra do
que aconteceu logo em seguida, o que você sentiu quando me viu pela primeira
vez? – Disse apontando para Daro, como se desse a deixa para ele responder.
— Não sei direito... Foi como
quando estou caçando, tudo ficou de vagar e eu senti todo o meu corpo em alerta
máximo. Mas eu estava concentrado em não ser pego, então isso explica.
— Sim, explica, mas não
aquela intensidade. Naquele momento a sua aura praticamente explodiu dentro do
seu corpo emanando de você uma energia que parecia queimar o ar a sua volta. –
Bis gesticulou batendo a mão na roupa empoeirada para fazer a poeira subir como
se fosse à queima do ar de que falava – Era quase como se a sua aura se
alimentasse da minha ou algo assim, pois me senti fraco e vulnerável nesse
momento. A questão é que comecei a reparar a cada novo encontro nosso que isso
só ocorria depois que a minha aura chegasse até você, quase como se o gatilho
fosse você sentir a minha aura. –disse tocando no próprio peito – Depois que
percebi isso, eu retraio minha aura o máximo que posso. – Finalizou. A essa
altura Daro já estava com a cara quase colada na grade.
— Quer dizer que eu tenho potencial
pra ser um mago como o meu irmão e o meu pai? – Perguntou quase saltando de
alegria.
— Eu não disse isso, mas que
você tem alguma coisa, você tem. – Bis se apressou em desfazer o mal entendido.
Mas a essa altura Daro já não prestava mais atenção no que ele falava.
— Acho que já sei como vou
conseguir passar no teste e acho que vou precisar de você pra isso. Até depois.
– gritou Daro do meio do caminho já correndo para a saída. Alguns minutos
depois Daro chega correndo com algumas coisas nos braços.
— O que são essas coisas? Pra
que servem? São Mágicas? – Mais uma vez Bis demonstra sua curiosidade sem fim.
— São as coisas que Calus
usava quando começou a aprender magia. Já tentei usar, mas eu nunca consegui.
— Certo, e como vai conseguir
agora? – Bis quis saber.
— Eu disse que iria precisar
de você! – Daro deu um sorriso sugestivo – Você disse que a minha aura aparece
quando você mostra a sua, quero que faça isso quando eu tentar congelar esse
líquido. – disse destampando uma botija bem adornada que estava dentre os
objetos que trouxe. Despejou um líquido azulado em uma taça de prata e
posicionou a sua frente – Agora é a sua vez, faça com que a minha aura
desperte. – Disse se concentrando. Sem demora e doido pra ver o que ia
acontecer, Bis começou a liberar, deixando o lugar se encher com a sua aura e
por concequencia fazendo com que a de Daro logo reagisse. Daro com toda a sua
concentração voltada para o líquido a sua frente. Nada acontecia... Nada além
da visível irritação que Daro começava a manifestar. Começava a ofegar, seu
cenho contraia cada vez mais, seus cabelos se arrepiaram, por outro lado Bis se
entusiasmava cada vez mais liberando mais e mais o seu poder, até perceber que
Daro não dava mais atenção nenhuma ao que propunha inicialmente.
— E agora? Cadê a magia? Não
parece estar acontecendo nada. – disse Bis quase em gargalhadas de felicidade.
Daro permaneceu quieto por uns segundos antes de esboçar um breve rosnado,
levantou as vistas para Bis, revelando seus olhos de tom avermelhado e caninos
volumosos – Acho que não foi uma boa idéia! – Exclamou Bis começando a sentir
medo e retraindo sua aura para si, enquanto a de Daro só crescia e o deixava
fora de si. No instante seguinte, Daro estava com o punho a poucos centímetros
das grades que começaram a brilhar criando um escudo que impedia Daro de sequer
atingir a grade.
No portão principal, Taram chegava
acompanhado de Calus. A fileira dupla de magos já estava posicionada para a
chegada.
— Procure seu irmão e tente
fazer com que ele use o medalhão imediatamente. Não podemos arris... – Antes
que Taram pudesse terminar a frase, Calus sussurrou “Daro” e saiu correndo, não
demorou mais que meio segundo para Taram também perceber que algo acontecia no
subterrâneo. Os dois começaram a correr como nunca. Atravessaram um salão,
viraram a esquerda logo depois, desceram as escadas a frente, depois a esquerda
de novo, mais escadas, a escuridão já tomara conta do espaço, a porta estava
entreaberta deixando passar um filete de claridade da tocha adiante. Uma aura
poderosa se manifestava entre rosnados e estalar de golpes em algo. Daro.
Entraram correndo, mas paralisaram assim que viram o que estava a sua frente.
Parecia Daro, mas que cabelos arrepiados eram aqueles? E os olhos de tom
avermelhado? Sem falar das presas. Parecia possuído ou algo assim. Ele
esmurrava o escudo que a grade produzia, gerando rachaduras e um estalar de
ossos quebrando. Calus não hesitou e sacou um colar do bolso, mas antes que
pudesse fazer alguma coisa Daro arremessou o punho contra o escudo mais uma vez
fazendo-o em pedaços e ao mesmo tempo quebrando um pedaço da grade.
— Rápido, cuide do Darksh. –
Gritou Taram partindo em direção a Daro com o punho armado em golpe. Antes que
Daro pudesse dar mais um golpe nas grades, o mago já estava com o punho no chão
próximo dele. Teletransporte. O clarão, o estalar de trovão e o circulo de
brasas crepitantes foi o que sobrou onde os dois estavam.
— Finalmente livre. – Veio um
voz de algum lugar. Uma poeira preta foi saindo pelo espaço da grade que Daro
quebrou.
— Ainda não Darksh... Não se
esqueça de mim. – Disse Calus se posicionando para a batalha, mas um pouco mais
relaxado por Daro não estar mais ali.
— Você é só uma criança! – a
poeira começou a tomar forma. Primeiro uma silhueta quase tão grande como
Taram, depois se fazendo materializar num homem grande e forte apesar de esguio
– O que é esse colar? O que ele faz? Era para Daro ou para mim? – E lá foram as
perguntas rotineiras. A aparência mudara, mas ainda era a mesma criatura curiosa
de sempre.
— Posso ser uma criança, mas
sou mais do que suficiente para te conter. – Calus começou a liberar a sua aura
que logo preencheu o lugar – Você será um bom teste. – Finalizou incisivamente.
— Ora vamos... Diga-me o que
isso faz. Se me disser eu te deixo viver. – mau terminou de falar e Calus já
estava próximo. Havia conjurado selos de amarrações de todos os lados do
Darksh, porém ele simplesmente desapareceu e reapareceu atrás de Calus em
seguida, liberando a sua aura de morte – Não pode comigo criança.
—Há várias formas de se
ganhar uma luta. – murmurou Calus ainda de costas, quando Bis começou a se
enfraquecer. Ao olhar para o chão estava em cima do medalhão – Ai está a sua
resposta. É um amuleto de contenção, muito poderoso e parece que também funciona
para Darksh.
— Legal! – murmurou com um
sorriso moribundo de quem estava tendo os poderes drenados.
— Sabe... Até que toda essa
situação veio bem a calhar. Soube que ao firmar um trato com alguém um Darksh
não pode voltar com a sua palavra. Tenho uma proposta para você Kalebs.
— Se tirar o medalhão de
perto de mim podemos conversar melhor. –Disse Bis entre dentes se remoendo no
chão. Calus se aproximou e o pegou de volta para alivio do Darksh.
— Diga-me, tem interesse de
sair daqui Kalebs?
*E.5.: Era dos 5
*1781: Ano
*7/2: 7° dia da 2° quinzena
*OUT.: Outono
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