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terça-feira, 6 de junho de 2017

A GERAÇÃO DE PRAGAS

Parte 5

                     MEMÓRIA OU SONHO: Um despertar

E.5.: 1793, 13/1 VER.

Tantrum (extremo oeste do território mágico)



A única porta da masmorra se abriu com ranger fino e irritante. A luz da tocha rasgou a escuridão revelando o guarda arrastando um garoto surrado, pela gola da camisa puída, abriu a porta da cela e jogou o garoto da porta mesmo.
— Ainda tentando fugir? – Perguntou o velho na sela em frente.
— O idiota não entende que só tem três formas de sair daqui Doms. –inferiu a resposta o jovem na sela ao lado – Pra forca; pra arena; ou pro mercado.
— Não me importo com o que você pensa Calus. – afirmou o garoto estirado no chão – Eu vou sair daqui, vocês vão ver, não serei prisioneiro pra sempre.
— Não mesmo...  Será um defunto logo logo se continuar com essa marra toda.
— Calus, pare de implicar com Daro. O garoto só quer ser livre. Quem somos nós pra dizer que ele está errado em querer sair daqui? –Proferiu o ancião, apaziguando os jovens.
 
— E por que você também não tenta sair daqui Doms?
— Lembra-se quando você foi jogado aqui Calus? Bom... Eu já era velho, Imagine agora filho! A essa altura só o que eu posso fazer é escolher o lugar onde vou morrer, e posso te garantir que mesmo velho, também não será aqui.
— E onde será Doms? Na cela ao lado? – Gozou Calus.
— Hahahahaha... Não se preocupe garoto, você vai ver... Você e Daro.

 Semanas se passaram entre tentativas de fuga de Daro, implicâncias de Calus e apaziguações de Doms, até que o dia da feira chegou.

— Calus, Daro, acordem. – Sussurrou o velho para os garotos levantando sonolentos.
— O que foi Doms? – Questionou Daro esfregando os olhos.
— Espero que você esteja morrendo pra me acordar desse jeito! – Resmungou Calus.
— Quase isso. – explicou Doms sussurrando – Como vocês já devem ter percebido hoje é a feira.
— Sim, idaí? Não te venderam antes, e não vão te vender agora, e a gente ainda não tem corpo pra ser vendido por um bom preço.
— Vocês vão fugir hoje. – interrompeu o velho ficando sério – Quando eu for pra arena, Daro encoste o máximo que puder na grade do lado direito da sua cela, e Calus o máximo à esquerda, e quando chegar à hora, vocês estarão livres. – Completou Doms agora com um sorriso fraternal no rosto.
— Parece que você já escolheu onde vai morrer, não é mesmo! –Proferiu Calus abaixando a cabeça para esconder as lagrimas que brotavam de seus olhos.
— Como assim? Como assim morrer? E que história é essa de você ir pra arena? – Questionou Daro sem compreender direito o que estava acontecendo.
— Ele... Ele vai morrer por nós seu idiota. – Respondeu Calus agora sem conseguir segurar as lagrimas. Foram quase dois anos convivendo com o velhote, e por mais que odiasse levar broncas quando implicava com Daro, o jovem enxergava nele uma figura paterna no meio de todo aquele inferno, assim como Daro.
— Morrer? Como assim morrer? – Continuou Daro ainda incrédulo e com lagrimas precipitando em seus olhos.
— Como eu disse outro dia, eu só posso escolher onde vou morrer garotos, mas vocês por outro lado estão jovens, tem muito que viver.
disse o ancião com voz acalentadora – Fora daqui, eu os teria treinado, mas aqui dentro, só o que eu posso fazer por vocês é isso. Calus leia-o com atenção e cuide de Daro, ele ainda vai fazer coisas grandes. –Profetizou Doms sacando um pequeno livro com capa de couro que ele escondia de baixo da pedra que ficava sentado.
 A porta se abriu, os dois guardas pararam em frente à sela de Doms e abriram a tranca.
— Vamos velhote, a platéia está ansiosa. – Disse um dos guardas algemando Doms.
— Irmãos protegem um ao outro, custe o que custar. – Disse Doms enquanto era empurrado para fora.
 Ao fechar da porta, a masmorra caiu de novo na escuridão, e a tristeza e as lagrimas eram a única coisa que prevalecia no ambiente. A sensação de quando algum ente querido morre, é desoladora, mas o que se sente quando alguém morre por você, é muito pior, e Daro sabia disso, a sensação de medo, impotência, fraqueza e o pior de tudo, a sensação de culpa.

    Por que alguém sempre tem que morrer pra que eu viva.

— Daro, encosta nas barras rápido. – ordenou Calus.
— Você não manda em mim. – Gritou Daro entre soluços de choro.
— Eu sou o mais velho, obedeça, ou você quer que o sacrifício do velhote seja em vão? – rebateu Calus – A gente tem que sair daqui, “custe o que custar” lembra? Devemos isso a Doms. – Finalizou com a voz mais branda e tremula.
 Os garotos recuaram para a grade, cada um do seu lado e lá permaneceram escutando o leve som que conseguia chegar até eles vindo da platéia da arena. Pareciam todos empolgados com a aparição de um velho pra enfrentar os gladiadores veteranos. Talvez pelo fato de ser uma morte certa.
 Os gritos de empolgação se transformaram em gritos de desespero e caos logo depois do primeiro estrondo. Não dava pra saber o que estava acontecendo, mas os tremores e gritos desesperados davam a idéia de um exercito atacando. Os garotos se mantiveram em suas posições até que começou um tremor tão forte que pedaços do teto começaram a cair. O estalar das paredes foi ensurdecedor, abrindo um rombo nas paredes que partia da arena até a fora da cidadela. O impacto jogou longe as barras que separavam Calus e Daro, dando os dois uma perspectiva da liberdade. Calus segurou no braço de Daro assim que pode ver a luz de fora, e saiu em disparada arrastando Daro no meio da poeira espessa.

— Prisioneiros em fugaaa!! – Gritou o sentinela que mesmo em meio ao caos criado por Doms ainda mantinha a vigília.

          Droga!

  Mais cinco sentinelas se juntaram e amaram as flechas para os disparos, mas antes que pudessem disparar, um feixe de luz moldado como uma lâmina os atingiu matando-os de imediato. Sorte! Doms ainda estava combatendo, e não deixaria seus esforços serem frustrados por meras sentinelas.  A muito custo, se esgueirando por entre os escombros e vielas, os garotos conseguiram fugir para a floresta, mas a sensação não era bem o esperado, talvez pela forma como conseguiram fugir.

...


 — Irmãos sempre protegem um ao outro... Custe o que custar.  – Disse Daro como se recordando de algo.
— Mas do que diabos você está falando sua aberração!
 Daro ignorou o comandante como se não o ouvisse, e logo depois o olhou com determinação desaparecendo no instante seguinte, e reaparecendo em frente ao comandante. O ataque estraçalhou o selo que o comandante quase não consegue conjurar a tempo, e não fosse a posição de defesa do comandante atrás do escudo para bloquear, o golpe, seria fatal. Golpes e contragolpes insanos se seguiram. Os dois lutavam de igual para igual agora. Tanto Daro quanto o comandante defendiam os golpes com maestria devolvendo outro de igual poder e letalidade. O cansaço já era visível em ambos.  Daro juntou tudo o que tinha para um golpe final, e no mesmo instante que percebeu isso, o comandante fez a mesma coisa. Ambos com o ataque máximo armado partiram um para cima do outro. Uma esfera de luz avermelhada envolvendo os dois. O impacto gerou uma onda que jogou longe metade do esquadrão que observava, e levantou uma poeira fina, que pairou por alguns segundos. Quando a luz começou a se dissipar, se fizeram visíveis dois vultos em meio à poeira.
— Por que o senhor o deixou fugir senhor?­ – Questionou o comandante.
— Por que você perdeu Gradian, e eu não o deixei fugir, você foi quem deixou! – Proferiu o velho escorado em seu cajado a frente do comandante – Há quanto tempo você não caça Gradian? Os anos parecem o ter amolecido um pouco! – Completou meio risonho o velho.

 A poeira baixou e quando todos viram o velho à frente do comandante Gradian, começaram a se curvar em respeito ao homem, como se ele fosse alguém muito importante. O velho se virou para Gradian e passou por ele a passos curtos, até sumir muralha adentro.




*E.5.: Era dos 5
*1793: ano
*13/1: 13° dia da 1° quinzena

*VER.: verão

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